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Drama noir ‘Astrágalo’ supera artificialismo da estética em preto e branco

Não é gratuita a escolha estética da diretora francesa Brigitte Sy ao realizar o seu “Astrágalo” em preto e branco. Se por um lado aproxima a imagem da narrativa, passada na década de 1950, numa busca temporal, por outro reverencia o cinema noir, além de se alinhar a um dos grandes defensores do P&B, Philippe Garrel – com quem Sy trabalhou como atriz e teve dois filhos, Louis e Esther Garrel, que atuam nesta produção.

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Porém, a opção da diretora está mais ligada a um estilo, do que propriamente ao tratamento da luz e sua conexão real com o que se passa na tela. O cinza predomina sobre o jogo de sombras, como se a imagem, a princípio, fosse captada colorida e, mais tarde, submetida a um filtro, sem pensar em sua condição final em preto e branco. Um artificialismo assinado pela fotografia de Frédéric Serve, compactuado por Sy (com quem já havia trabalhado no inédito no Brasil, “Les Mains Libres”).

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O que poderia ser uma estranheza, no entanto, é superada pelo trabalho da atriz Leila Bekhti, que preenche a tela cinza com uma luz própria. Ela protagoniza a autobiografia da escritora franco-argelina Albertine Sarrazin que, em seu livro homônimo de 1965, descreveu sua vida de prostituta, bandida e presidiária, em uma França que lhe oferecia um tríplice preconceito em relação à delinquência, a ascendência e ao fato de ser mulher.

O roteiro, assinado por Sy e Serge Le Peron (ex-crítico da revista “Cahiers du Cinema”), tem início com ar noir, ao mostrar Albertine (Bekhti), condenada a sete anos de prisão por um malogrado assalto, escalando o muro do presídio. Na queda, quebra o tal astrágalo (um osso ao lado do calcanhar) e, ao se arrastar até a rodovia, é socorrida por Julien (o excelente Reda Kateb), que a acolhe sob sua proteção.

Ambos são criminosos fugitivos e se apaixonam, levando a acreditar em uma espécie de Bonnie e Clyde, o casal americano icônico da década de 1930. Mas não há nada de romântico na história de Albertine que, deixada em Paris para Julien praticar delitos em outras cidades, se vê obrigada a prostituir-se pelas ruas de Montmartre, com uma peruca loira e nome de guerra de Sophie.

Ela espera por seu salvador Julien, apesar de reconhecer que não deveria estar com ele. Nas páginas do diário que escreve, de um surpreendente alcance poético (narrativas em off retiradas do próprio livro-fonte), mostra esse paradoxo, que também divide com sua amante, porém não amor, Marie (Esther Garrel), a mesma que a fez ir para a cadeia.

Sy, com o que tinha nas mãos, cria uma personagem forte que ganha ainda mais proporções com a atuação de Bekhti, tal como Kateb. Essa entrega do elenco poderia ser vista como normal em filmes dirigidos por atores ou mesmo no viés do realismo francês, que dá peso à presença deles como elemento fundamental. Mas Sy acerta na dosagem do drama, o que se sobrepõe até mesmo aos subterfúgios que usa ao filmar em preto e branco.

 

Assista ao trailer do filme:

 

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