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‘Loucas de Alegria’ retrata amizade entre mulheres disfuncionais

Despontando como um dos grandes nomes de um novo cinema italiano, Paolo Virzì compõe em “Loucas de Alegria” uma comédia dramática em torno de personagens disfuncionais. Para o êxito da empreitada, conta com o envolvimento total de duas atrizes em plena forma, Valeria Bruna Tedeschi (que atuou no filme anterior de Virzì, “Capital Humano”) e Micaela Ramazzotti (sua musa em “A primeira coisa bela”).

É possível enxergar referências múltiplas na história destas duas mulheres, Beatrice (Valeria) e Donatella (Micaela), internas numa clínica psiquiátrica, a Villa Biondi, para pacientes com algum passivo com a justiça. Uma destas referências, certamente, é “Thelma e Louise”, de Ridley Scott, especialmente no segmento em que as duas fogem e caem na estrada num automóvel roubado.

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No entanto, é num humor negro peculiarmente italiano – e que, por ser latino, apela profundamente aos brasileiros – que o filme de Virzì encontra sua identidade. Sem nunca escamotear as fragilidades e erros de suas protagonistas, ele abre caminho para que expressem personalidades complexas, encontrando assim a chave de uma humanidade muito contemporânea.

Beatrice é a socialite caída em desgraça por seu envolvimento com um tipo mafioso, que a levou a dar golpes financeiros que arruinaram sua família. Mesmo restrita à clínica, sem liberdade para passeios e à base de remédios tarja preta, ela nunca perde a pose. São hilários seus comentários sobre comida e figurino e suas memórias de grandeza, quem sabe o quanto reais ou imaginárias.

Sentindo-se aristocrática, ela resiste a engajar-se nas tarefas comunitárias em que se ocupam os demais pacientes, o que lhe vale um maior isolamento – e acessos de uma inevitável tristeza e solidão, que ela disfarça debaixo de um jorro sistemático de palavras, que poucos, no entanto, param para ouvir. Em todos os seus gestos, há um componente de encenação, este é seu número.

A chegada de uma nova paciente, Donatella, em tudo oposta a Beatrice, não parece promissora. A recém-chegada está devastada, física e emocionalmente, com um histórico de uso de drogas e uma tentativa de suicídio junto com um filho bebê (que sobreviveu e foi entregue à adoção). Resiste a mover-se, falar, até comer. Mas o par inusitado se forma, até porque a moça silenciosa sabe, como ninguém, ouvir a tagarela Beatrice.

Um passeio de pacientes dá às duas a oportunidade de uma fuga – a bem da verdade, arquitetada por Beatrice. Fora do ambiente protegido da clínica – que, nestes novos tempos, em nada se parece com o hospital repressor de “Um estranho no ninho” -, as duas vão experimentar seus limites, em aventuras que envolvem um shopping center, um restaurante chique e contatos com figuras do passado, como as respectivas mães de cada uma (vividas por Anna Galiena e Marisa Borini, mãe real de Valeria Bruni) e o ex- de Beatrice (Bob Massini).

Esses momentos na estrada substituem, com vantagem, os flashbacks, permitindo entender o percurso emocional de cada uma – em que cabe uma enorme dor, perdas e melancolia, mas também os sonhos que as alimentam.

É particularmente tocante o esforço de Micaela para reencontrar o filho, incorporando situações com alto risco de pieguice, de que o filme finalmente se safa. Emerge deste retrato de duas mulheres, afinal, um profundo respeito por suas escolhas e dificuldades. Assim, é possível o espectador habitar o espaço em torno delas e tornar-se também seu cúmplice.

 

Assista ao trailer do filme:

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